Advogada fala sobre os direitos da licença-paternidade e ressalta como esse benefício reflete em questões de igualdade de gênero
Não é de hoje que se discutem as consequências da maternidade na vida profissional de uma mulher. Aliás, um dos marcos nacionais históricos relacionados a isso é a criação da licença-maternidade, em 1943, junto ao surgimento da Consolidação das Leis do Trabalho, que garante às mães asseguradas pelo INSS o afastamento das atividades alguns dias antes do parto e 120 após o nascimento ou adoção. Mas e os pais, também têm esse direito?
Criada 45 anos depois da licença-maternidade, a lei que dá direito ao afastamento paterno das atividades de trabalho ainda hoje é uma conquista que precisa de alguns ajustes. Principalmente no que se refere à igualdade de gênero em relação à carreira, à vida pessoal e familiar. Pensando nisso, o Dicas de Mulher convidou a advogada Maria Gabriela Brandino para explicar sobre a licença-paternidade e auxiliar na compreensão de como esse direito pode trazer benefícios às mulheres. Veja a seguir!
O que é a licença-paternidade e quem tem direito ao benefício?
Brandino explica inicialmente que, tratando-se do âmbito trabalhista, “licença é a possibilidade de ausentar-se das responsabilidades laborais sem prejuízo no salário”. Para os homens, a lei brasileira prevê uma licença de 5 dias consecutivos após o nascimento ou a adoção do filho, “podendo ser prorrogado por mais 15 dias caso a empresa seja consignatária do Programa Empresa Cidadã”, afirma a profissional.
A advogada esclarece ainda que o benefício é de direito de “trabalhadores assegurados pelo INSS ou regime de previdência próprio, no caso dos servidores públicos”. Além disso, ela revela que, para “os servidores públicos federais que sejam responsáveis monoparentais ou pais solo, a licença é equiparada à licença-maternidade e tem como prazo 180 dias”.
Sobre quem tem o direito a essa licença, Brandino relata que, além dos homens cisgêneros que são pais, biológicos ou adotivos, os homens trans também estão inclusos nesse benefício. Para além disso, a advogada ressalta: “É importante destacar que, aos homens que decidem gestar, a licença concedida será equiparada à licença-maternidade em prazo, estabilidade, redução de jornada e todos os outros direitos”.
O período da licença paterna, de acordo com a advogada, conta “a partir do primeiro dia útil do nascimento ou adoção”. Para solicitar o afastamento, é necessário que o profissional contate a empresa comunicando o requerimento do benefício e, quando possível, apresente os documentos necessários para comprovação.
O tempo da licença-paternidade pode ser prorrogado?
Como exposto acima, a licença-paternidade é concedida pelo prazo de 5 dias, podendo haver ou não prorrogação por mais 15 dias. Contudo, Brandino afirma que, além dessa extensão do afastamento, também é possível aumentar o prazo mediante políticas internas das empresas ou por acordos coletivos.
“Atualmente, o que tem se oferecido para além disso é um regime híbrido de trabalho para proporcionar atuação em home office, caso a atividade laborativa seja condizente”, afirma a advogada. Ela pontua que, nesse caso, as negociações são feitas entre o trabalhador e a empresa e não possuem respaldo na lei.
Frente à reflexão sobre o prazo da licença-paternidade e pensando na divisão igualitária de tarefas em relação à chegada de um filho na vida conjugal, familiar, profissional e pessoal, Maria Gabriela Brandino levanta um questionamento: “É possível falar que 5 dias é suficiente para compartilhar as responsabilidades de modo proporcional?”.
Diferença entre licença-maternidade e licença-paternidade
Na lei, a única diferença existente os dois tipos de licença diz respeito ao tempo de afastamento para homens e mulheres, sendo 5 dias para os pais e 120 dias para as mães. Com isso, a profissional propõe uma reflexão social referente à igualdade de gênero. “A principal diferença das licenças, na minha compreensão, está na divisão sexual do trabalho, que tem uma lógica binária (homem/mulher) determinada socialmente e não de modo natural, como se argumenta”, afirma.
Brandino discute sobre o estigma social de que a mãe deve ser a cuidadora, enquanto o pai necessariamente deve ser o provedor. “Se a licença é a possibilidade de proteção do trabalho para garantia da parentalidade, há que se pensar no aumento da licença-paternidade para garantia da divisão de responsabilidade e cuidado sem a reprodução da lógica patriarcal”, ressalta.
Aliás, essa discussão, recentemente, tem ganhado visibilidade social. Atualmente, como afirma a profissional, dois projetos de lei estão em tramitação no Congresso Nacional: “O Projeto de Lei 1974/21, sobre o instituto da parentalidade no Brasil, e o Projeto de Lei 879/11, que propõe aumento da licença-paternidade para 30 dias”, informa Brandino, que segue ressaltando a importância deles.
“Considerando a necessidade de desconstrução dos papéis sociais que reproduzem opressão e sobrecarga das mulheres, acredito que a reflexão sobre direitos assegurados às pessoas de referência – e não à mãe ou ao pai – e o projeto de lei que versa sobre a parentalidade têm muito a contribuir”, finaliza a advogada.